“Tem pessoas que são personagens na internet, e é normal né, no caso eu sou igual no Twitter e pessoalmente”. Foi uma das muitas frases impactantes de Jéssica Liar durante uma entrevista para o MGG Brasil. Fotógrafa e cinegrafista de criadores de conteúdo para criadores, empresas e esports - como a mesma se rotula -, a paulista tem 30 anos e mora desde sempre na Freguesia do Ó, zona noroeste de São Paulo. Além disso, ela tem um cachorro chamado Mostarda (porque acha que cães devem ter nome de comida).
Com a fotógrafa, damos continuidade à série de conteúdos especiais contando histórias sobre personalidades do cenário de esports.
Além das câmeras
Jéssica trabalha oficialmente como fotógrafa há seis anos. Formada em Tecnologia da Informação, uma área totalmente diferente da qual atua agora, ela começou a fazer Ciência da Computação com o sonho de construir câmeras.
Ligada ao campo da comunicação e criação de conteúdo desde sua infância, começou a fotografar aos seus 13 anos: “Comecei a criar conteúdo na internet com 12 anos no Fotolog, então já fazem 18 anos que eu crio conteúdo para a internet, desde a época do Orkut”.
O que pode ser surpreendente para muitos é que Jéssica Liar era emo. Muito.
“Era emo, sou emo, sempre fui. É um traço de personalidade. Eu era do movimento mesmo, de ir em show, porta de show, maluca, doida. Com meus 13 anos eu já ia em show e levava minha câmera. Ninguém nunca postou minhas fotos, mas eu continuava tentando tirar fotos das bandas. Vida que segue. Mas pelo menos no Fotolog eu fazia um sucesso, então tá bom, né?”
Pertencente a uma família gamer, na qual todos jogam: seu pai, sua mãe e seu irmão, Jéssica joga Valorant sempre que pode, o jogo do gênero FPS da Riot Games.
“Ontem, inclusive, estava tendo treta de Coinmaster aqui, minha mãe, meu irmão e minha tia ‘tretando’ porque um ficava roubando o outro. Minha família é muito festeira e muito unida, talvez seja por isso que eu seja assim agitada.”
Em um diálogo sincero e necessário, a fotógrafa falou um pouco sobre a importância de acompanhamento psicológico - sobretudo para aqueles que trabalham com internet e comunicação, e experiências de sua vida.
“Faço terapia para aguentar viver na internet, que é minha casa, inclusive meu terapeuta foi escolhido porque ele se especializa em como as redes sociais afetam a cabeça das pessoas. Já faço terapia com ele desde 2018. E só tô aqui onde eu tô porque faço terapia, já fui diagnosticada com depressão.”
O início nos esports
Com um vocabulário no mínimo incrível, Jéssica Liar vê sua inserção como profissional no cenário gamer como um grande “trupico”.
A fotógrafa teve início no YouTube Space, quando estava desempregada em 2015 e viu a oportunidade de criar conteúdo enquanto procurava por um emprego fixo na área de TI. Assim, inaugurou seu canal na rede social fazendo o desafio VEDA, vídeos em formato de vlogs postados diariamente no mês de abril, rapidamente alcançando a marca de 1.600 seguidores. Na época, com 1.000 seguidores era possível frequentar os eventos realizados no YouTube Space.
Desta forma, nunca deixando sua câmera de lado, Jéssica conta que comprou uma lente nova e passou a fotografar aqueles que gostariam de ser fotografados: youtubers. “Comecei a levar a câmera nos happy hour, as pessoas começaram a conhecer meu trabalho, porque uma pessoa cara de pau é sempre cara de pau, não é mesmo? Com isso, o YouTube passou a me contratar para todos os eventos, fiz o YouTube Black, fiz workshop para gringo. Por conta disso eu passei a conhecer muita gente, muitos youtubers. Passaram a perguntar quanto eu cobrava para fazer um ensaio - e eu nunca tinha feito um ensaio real assim. Comecei a fazer um ou outro e começou a dar certo, com muitas oportunidades vindo”, contou ela sobre a época.
Jogadora de League of Legends desde 2017, Jéssica começou a assistir muito ao Campeonato Brasileiro de League of Legends (CBLOL) por conta da pandemia e simpatizou com o ex-analista Gustavo “Melão” Ruzza, fazendo uma brincadeira com ele pelo Stories do Instagram. Foi quando ele viu a brincadeira, a seguiu de volta e se assim eles se tornaram amigos. Ela diz que foi esse o “trupico” que a fez cair nos esports.
Após meses com as suas atividades profissionais em pausa por conta da pandemia, o retorno da fotógrafa com uma câmera teve Melão como “cobaia” para testar os equipamentos de estúdio que ela investiu. A paulista destrincha que logo após as fotos com Melão surgiu a proposta que a inseriu de fato nos games:
“Logo depois das fotos com o Melão, o Bruno “Foca” Alvares, fotógrafo oficial do CBLOL há anos, me mandou mensagem. Lembro que quando ele entrou em contato eu fiquei 40 minutos olhando para o celular, liguei para minha amiga falando que o Foca me mandou mensagem e eu não iria responder, porque enquanto eu não respondesse, eu era uma possível fotógrafa de games, mas se eu respondesse ele poderia abrir uma doceria e pedir para eu tirar foto de produto.”
Felizmente para Jéssica e para todos que a acompanham, de fato era uma proposta para fotografar um evento de esports: a Liga Brasileira de Free Fire 4.
“Tamo aí até hoje: foi um trupico”.
Gente como a gente, Jéssica Liar é uma mulher extremamente extrovertida, sincera e que até o momento acha surreal a guinada que sua vida deu.
“Me imaginei trabalhando com jogos, de trupicar, cair e fotografar o Ranger? Que eu olhava e pensava ‘nossa o Ranger joga muito’, nunca mesmo. Tem hora que eu realizo e penso ‘que que isso cara? que que tá acontecendo na minha vida?’. O dia que o Ranger mandou e-mail eu fiquei muito nervosa, demorei uns dois dias para responder só olhando para a mensagem. E o Ranger é um fofo.”
“Encontrei com o Melão em um café aberto esses tempos e a única coisa que eu falava pra ele era: ‘mano, eu não sei o que está acontecendo da minha vida’, foi quando ele respondeu ‘Imagina quando voltar o presencial’, e eu só conseguia pensar ‘calma que esse é um problema da Jéssica do futuro’.”
Melhor experiência no cenário de esports
“O dia que eu entrei para fotografar a LBFF 4, eu chorei igual uma porca velha. Eu nunca tinha visto um palco de games assim, quando eu entrei ali e realizei que eu iria fotografar o Nobru eu fiquei em choque. Eles começaram a perguntar sobre a ausência do último fotógrafo, que costumava cobrir o evento, e eu já comecei a achar que eles me odiavam, mas agora eu já sou muito amiga da galera do Free Fire. A melhor experiência foi de fato ter entrado no estúdio da Garena, aquilo marcou muito a minha carreira.”
Jéssica conta que hoje é muito próxima das personalidades do Free Fire, mesmo nem jogando o jogo: “o VgzinnN virou muito meu amigo no início do ano, da gente jogar Valorant junto”. Revela também que o Melão acha que o cenário de Valorant a adotou.
Divulgas Corp. e planos para o futuro
Como uma piada interna - com o Twitter inteiro -, Jéssica compõe a “Divulgas Corp” ao lado de Leo Marques, o Editas, e Gabriel Freire, o Desenhas. Algo que surgiu após a brincadeira do nome de Jéssica ser “divulgação”, pela falta de créditos em suas fotos no meio jornalístico.
“A Divulgas Corp. é uma brincadeira, eu sou a Divulgas e tem o Leo que trabalha comigo editando vídeo e o Gabriel editando fotos. A gente fica só na zoeira, não é minha intenção ter uma produtora Divulgas, acho que o Leo tem que caminhar sozinho.”
YouTube, Twitch e Twitter
Perguntamos para Jéssica quais são seus planos nas diferentes plataformas que atua. A paulista contou sobre sua ambição no Twitter, sobre como se identifica com a plataforma e como quer focar no potencial com o público, sobretudo em sua bolha de criação de conteúdo gamer.
“Demorei muito para entender qual é minha linguagem de criação de conteúdo, mas agora eu entendi: são vídeos curtos. Conteúdo que cabe no Twitter, hoje eu quero abraçar a galera gamer - que tá toda no Twitter -, então meu potencial é muito maior no Twitter. Eu vou replicar o conteúdo no Instagram, o conteúdo no YouTube, mas meu público hoje é o Twitter. Ensino a trabalhar com audiovisual, ensinar a usar a câmera da melhor forma, porque é você sozinha fazendo sua própria produção.
Eu realmente quero abraçar a questão criação de conteúdo áudio e vídeo, quero ajudar a profissionalizar o cenário em questão de criação de conteúdo, fazer parte disso. Porque é muito importante né, acho que eu converso com muita gente e todo mundo me fala e concorda que a criação de conteúdo nos games é embrionária ainda.”
Claro que, mesmo apaixonada por criação de conteúdo, não larga por nada suas lentes: “Meu objetivo é continuar fotografando para criação de conteúdo mesmo, gravando para criação de conteúdo dos games e abraçando quem quer ser criador de conteúdo na área dos games. Esses são meus planos principais. Falou de criação de conteúdo, meu coração até bate mais rápido”.
"Tenho planos não só de fotografia, mas poder montar um estúdio e poder ser patrocinada por marcas grandes. Imagina olharem e falarem “isso aqui é no estúdio da Jéssica Liar”. Marca de roupa também, imagina ser patrocinada pela Nike, ter um armário cheio de roupas da marca para quando uma personalidade precisa de roupar e não saber qual, ter a possibilidade de escolher no meu próprio estúdio.
Penso em alguns planos, como por exemplo: criar conteúdo sobre como usar melhor uma webcam usando produtos da Logitech, ou qual melhor celular para criação de conteúdo, diversas possibilidades.
Tenho na cabeça muitos projetos, o estúdio Jéssica Liar vai acontecer em algum momento. Eu quero criar isso como um projeto, um lugar de possibilidade de criação de conteúdo."
Foto: Divulgação
Para quem acompanha o backstage dos esports, sabe que se fez presente um diálogo sobre a importância de creditar os devidos artistas. Jéssica foi um fator fundamental na abertura desta conversa, por muito tempo seu nome no Twitter foi "Foto: Divulgação", de modo a fazer piada com esta problemática. Sobre isto, ela destrinchou:
"Agora a galera entendeu a importância de dar créditos, eu vejo agora uma mudança muito legal nisso em questão da área dos games, tem alguns sites aí que eu tenho vontade de dar uns tapas na cara ainda? Tem. Mas isso tem mudado, os jornalistas mesmo têm falado 'agora eu faço questão de ir atrás de quem é o fotógrafo', para entender melhor, para saber quem que é, para entender o estilo, e dar os devidos créditos.
É um negócio que eu falo sempre: 'Vamos criar juntos'. Você assina seu texto assim como você me ajuda a assinar as fotos porque as pessoas não dão os devidos créditos."
Jéssica acredita que o cerne do problema tenha sido que os profissionais da área da comunicação não consideram a fotografia como criação de conteúdo.
"Depois da matéria que fiz com o Lucas Gerardi (@lucasgerardi_), na qual disse que as pessoas precisavam entender quem fotografa cada coisa, deixei claro que cada um precisava trabalhar junto. Por exemplo, depois de conversar com jornalistas eu entendi que era necessário fotos na horizontal, é uma troca, eu fui aprendendo com eles e eles foram aprendendo comigo. Isso foi virando uma questão de ambas as partes."
Responsabilidade e a magia do cenário dos jogos
Em uma conversa totalmente descontraída, Jéssica contou sobre suas experiências enquanto trabalhava com criadores de conteúdo do YouTube. Era comum lidar de forma natural com grandes nomes da plataforma, mas quando passou para o cenário de jogos o nervosismo e a magia foi diferente ao perceber que ela estava em uma posição relevante.
Conversamos sobre influência, responsabilidade, a grandiosidade da internet em dias atuais e sobre se considerar uma pessoa influente.
“É difícil de acreditar, de entender que eu seja uma influência, talvez eu entenda mais quando chegar os eventos presenciais. Na internet é tudo sobre contato, sobre engajamento, quanto mais coisas acontecem na internet mais você precisa engajar com as coisas. Precisa de muita sorte, claro, mas muita identificação também. E muita cara-de-pau, precisa dar cara a tapa, fazer olharem para você. Nem tudo é um trupico, um convite de foto por parte do Melão foi algo que mudou minha vida completamente, tenho outra perspectiva de vida agora, mas foi muito por cara-de-pau. Foi muito estudo, ficar constantemente me atualizando, fazer MBA de Marketing. Eu lido com as pessoas no intuitivo, eu vou lá, sou do carisma e aproveito isso. O que eu falo para as pessoas é serem cara-de-pau".
Jéssica acredita que os jogadores profissionais não exploram o potencial da criação de conteúdo e não se veem totalmente como figuras públicas, mas com a mudança de valores na Twitch diversos streamers terão que conquistar um espaço nas redes sociais além da plataforma de transmissão: "Hoje talvez muitos pro players não sejam patrocinados e não tenham que criar conteúdo, mas em breve eles vão adotar isso".
"Tem muitas pessoas no cenário que não chegam preparadas para lidar com a responsabilidade que acabam tendo, são pessoas prestes a se tornarem “ídolos”. Você mexe com o coração, com a paixão de uma pessoa e isso é muito grande, tem muita gente que não entende isso, que não realiza isso. É muito importante entender qual é a responsabilidade em cima dessas coisas, porque às vezes leva muito tempo para digerir algo que é tão rápido."
Neste gancho, Jéssica Liar, que é apaixonada por criação de conteúdo, vê sua própria potência no universo dos esports: "Penso nos meus valores, no meu posicionamento, todas as coisas que faço é pensando que as pessoas possam me contratar todos os meses para criar conteúdo junto. Por isso eu trabalho tanto, porque consigo pensar nessas possibilidades. A intenção é a Divulgas Corp. atendendo criadores de conteúdo dos games, é gigante. Fico pensando que fotografei 18 times da LBFF, que tem pelo menos quatro jogadores. São pelo menos 72 possibilidades de jobs que podem fechar comigo. É entender como potencializar as coisas, criação de conteúdo é muito potencial: você trabalha com ídolos."
Para acompanhar Jéssica Liar:
- Twitch: jessicaliar
- Twitter: @jessicaliar
- YouTube: Jéssica Liar
- Instagram: @jessicaliar
- TikTok: @jessicaliar
- Portfólio: https://www.jessicaliar.com
- Orçamentos e contato: jessica@jessicaliar.com