André Akkari é o resultado de uma série de tomadas de decisões - decisões estas que o levaram a encontrar no poker uma forma de fornecer uma vida melhor para sua família, vencer um Bracelete no evento #43 do World Series of Poker (WSOP), torcer pelo Corinthians, fazer parte do Team PokerStars Pro, investir no esports por meio da FURIA, entre outras realizações e conquistas.
O MGG Brasil conversou com o jogador profissional de poker e co-proprietário da FURIA sobre o movimento e cultura que a organização se tornou, o início de sua carreira no jogo de cartas, a inquietação que o faz sempre criar novos projetos e mais.
Primeiro contato (tardio) com o poker
Diferente de muitas pessoas no meio do poker, Akkari não conheceu o jogo de cartas por meio de jogos mentais como o xadrez e o gamão. “Eu não jogava baralho, não achava isso legal, gostava de jogar bola. Nasci na zona leste de São Paulo, para mim a vida era futebol o dia inteiro na rua”.
No entanto, “logo no primeiro momento”, o poker fez Akkari se apaixonar em 2005. “Eu trabalhava em uma empresa de tecnologia e tínhamos um cliente que mexia com poker. Tivemos que instalar um software para fazer uma proposta para eles, então instalei e comecei a me divertir muito jogando ‘play money’, que é o que a gente chama de dinheiro fictício, e foi irado, eu achei o jogo demais!”.
Passando por problemas financeiros na época, ele uniu o útil ao agradável: sua curiosidade e vontade de estudar aquela nova possibilidade de ganhar dinheiro. Ainda assim, mesmo já adulto, ele enfrentou uma dificuldade ou outra para convencer sua família de que sabia o que estava fazendo.
O Bracelete
Atualmente, o Brasil é reconhecido como um país repleto de jogadores de poker com muito potencial e há anos Akkari está entre eles. Veterano no cenário, ele fez parte do movimento que auxiliou o reconhecimento do poker como um jogo de habilidade, e não de azar, no Brasil, e também entrou para a história do esporte por ter ganhado o segundo bracelete do país na história do World Series of Poker (WSOP), durante o Evento #43 do campeonato - este é o prêmio não monetário mais desejado pelos jogadores, tendo a mesma representatividade de um troféu, por exemplo.
Em uma conversa com diversas lembranças, quando questionado se estava nervoso no dia em que conquistou o bracelete, ele responde que sim, mas não de forma negativa. “Foi um dia épico, minha família estava comigo, filhas, esposa, melhores amigos, e ver todo mundo torcendo na arquibancada torcendo, gritando, comemorando, em uma cenário no qual isso não é comum, foi épico, porque não é todo todo que tem arquibancada lotada.
Se eu fecho os olhos, lembro exatamente do dia, do cheiro do ambiente, da textura das fichas que estava segurando. Eu estava nervoso, tinha que estar, é algo muito diferente do dia a dia de muitas pessoas e até mesmo de um jogador de poker, mas era um ‘mega nervoso positivo’, algo que me forçava a focar, a tomar melhores decisões, a não errar, então não me atrapalhou, muito pelo contrário. Na disputa, eu via meus oponentes nervosos com aquela torcida toda, com os brasileiros gritando”.
Como se estivesse diante da mesa naquele 28 de junho de 2011, ele acrescenta: “Sabia que tinha que tomar boas decisões, que no curto prazo um fator sorte pode tirar um título de alguém, mas no longo prazo eu já estava tomando a decisão certa. E quando você está ali, percebe que está tomando boas decisões, caso contrário já teria caído em 400º, 500º lugar. Quando você chega tão longe, quer ganhar de qualquer jeito e deu ‘nóis’, ainda bem que deu ‘nóis’”.
O resultado dos anos de estudo de poker
Como dito pelo próprio Akkari durante a entrevista, atualmente não se pode dizer que o poker sofre preconceito na sociedade: “preconceito é algo muito sério, existe preconceito de raça, de gênero, o poker não passa por isso”. Ainda assim, é possível dizer que a carreira do jogador profissional de poker segue sendo vista como algo inusitado e arriscado, embora hoje certamente seja mais fácil apresentar este universo a outras pessoas do que em 2005.
Vale lembrar também que é preciso enxergar carreiras de sucesso no poker para além de um discurso meritocrático, em que o esforço é simplesmente recompensado com a glória. Além de estudar o jogo para garantir bons resultados e boas tomadas de decisões, é necessário ter responsabilidade.
Somando uma coisa com a outra, aos poucos Akkari colheu os frutos de sua dedicação ao jogo e hoje coleciona uma série de lembranças importantes, que impactaram diretamente em sua vida e também que a tornaram mais divertida.
“Foram vários momentos que, quando eu olhava ‘de fora’, pensava: ‘car****, olha só o que tá acontecendo’. Quanto mais momentos assim vão rolando, menos choque você tem, você acaba se acostumando. O primeiro momento que me deslumbrou foi quando quitei meu primeiro apartamento. Foi épico porque minha esposa e eu tínhamos muitas dívidas, o banco pressionava a gente, ficávamos sem dormir quando os cheques voltavam, e de repente ganhei uma grande quantidade de grana que me permitiu simplesmente ir no banco e quitar aquilo. Quando peguei o papel da quitação, não acreditava que nunca mais nos cobrariam aquilo”.
Tornando-se referência no poker, Akkari começou a conhecer e se aproximar de suas próprias referências em outras áreas da vida. “Sou muito corintiano e de repente conheci o Ronaldo e isso é muito f***. Quando ele explodiu no Corinthians, eu ia nos jogos no Pacaembu, vibrava, chorava quando ele fazia gol e de repente ele estava sentado na minha frente jogando poker. Eu lembro de perguntar para ele: ‘É você mesmo ou é máscara?’. Com o Neymar foi a mesma coisa, mas mais intenso, ele é mais meu amigo, de fato, do tipo que está sempre junto. Em um primeiro momento você se choca. Conheci ele em uma coletiva da PokeStars e aí ele falou meu nome e me choquei. Quando ele me viu, levantou, me deu um abraço e aí começou uma amizade mais forte. Aí você se preocupa menos com o atleta que ele é e mais com a pessoa, porque passa a conhecer as pessoas em essência, não tem mais choque, só carinho, é uma parada muito legal”.
A tomada de decisão que o levou ao modo FURIA de viver
Apesar de conhecer o Counter-Strike e outros games quando mais novo, e de ter frequentado lan houses vez ou outra, Akkari diz: “essa nunca foi a minha vibe”, já que seu negócio era improvisar gols na rua para jogar futebol com os amigos. Foi já com uma carreira consolidada no poker que ele se aproximou dos esports.
“Conheci FalleN, Coldzera e o Taco pela primeira vez em Las Vegas. Eu estava jogando um mundial e o FalleN me mandou uma mensagem falando que estava lá também. Nos encontramos, eles foram super legais, fomos em uma balada juntos, demos muita risada e comecei a torcer pela SK na época”. Por volta do mesmo período, ele se tornou sócio da CNB ao lado de Ronaldo e Igor Trafane.
Pouco tempo depois, Akkari se tornou sócio da FURIA também. Esta decisão foi feita pelo jogador por conta de sua vontade de participar de uma organização que quisesse investir em um novo time brasileiro de CS:GO, algo que não fazia parte dos planos da CNB na época.
Quando questionado se imaginava que fazer parte da FURIA traria um sentimento tão grande de pertencimento e família, Akkari diz: “Quando entrei, não imaginava, não tinha ideia de que seria desse jeito, eu nunca havia participado de nada parecido com isso. O poker chegou perto, mas ele é mais descentralizado como empresa, porque era mais um movimento. Na vida você engaja com as coisas, por exemplo, empoderamento feminino não é uma empresa, é um movimento, um conceito, no qual você bate na realidade errada para construir a certa. O poker era sobre isso.
Quando você coloca empresa no meio, parece que esse processo de engajamento não é tão fácil de ser construído, porque fica estranho já que tem um lado comercial e financeiro. Mas logo no começo, quando começamos a crescer, vi que a FURIA estava indo para esse lado do engajamento. Temos muitas pessoas com capacidade, que querem evoluir enquanto tomam grandes decisões e participam de grandes processos”.
Ele ressalta ainda que enxerga a FURIA para além de uma família. “Não sou muito da tese da família como as pessoas enxergam normalmente. Família não se escolhe, você nasce ali e às vezes é ruim, às vezes você não tem a família que gostaria. Na FURIA é mais que isso, construímos uma parada juntos, escolhemos estar ali. Sou um cara de sorte porque eu teria escolhido minha família, mas sei de amigos que teriam escolhido outras. Esse conceito é relativo e na FURIA escolhemos estar juntos. E no dia que alguém não quiser mais, sei que vamos continuar conectados, porque o laço é maior do que o trabalho, uma circunstância”.
Foto de capa: Danny Maxwell Photography - DMP