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Ga Kim: Conheça a tradutora e intérprete de coreano do CBLOL

Ga Kim: Conheça a tradutora e intérprete de coreano do CBLOL
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A sul-coreana de 25 anos trabalhou em times como a Red Canids e o Flamengo hoje atua com a Riot Games e na Liga Latinoamérica de League of Legends, com a Isurus

Ga Kim: Conheça a tradutora e intérprete de coreano do CBLOL

"Sou uma garota super cara-de-pau no cenário, e muitas vezes ser cara-de-pau dá bom e ao mesmo tempo dá ruim, temos que saber lidar com os bônus e os ônus de ser cara-de-pau". Dessa forma começou a entrevista com Ga Kim para o MGG Brasil. Trabalhando desde 2018 no cenário de League of Legends, Ga atua como tradutora e intérprete de coreano, inglês e português na Riot Games, e também como tradutora na Isurus, equipe da Liga Latinoamérica de LoL. Não apenas, é influenciadora do Flamengo e CEO da escola de coreano Manse! Academia.

Ga tem 25 anos, é formada em Biomedicina pela USP e nasceu em Seul, na Coreia do Sul. Veio ao Brasil com seus parentes em 1999, junto com outras 10 famílias. Com ela, continuamos nossa série de entrevistas com personalidades do cenário de esports.

Ga Kim também é influenciadora do Flamengo — Foto: Ga Kim - League of Legends
Ga Kim também é influenciadora do Flamengo — Foto: Ga Kim

Entrou no mundo dos games quando começou a trabalhar com esports

Diferentemente da maioria das pessoas que almejam trabalhar com jogos eletrônicos, Ga contou que não era gamer quando entrou no cenário, lá em 2018, na Red Canids, mesma época que Guigo e Avenger entraram na organização: "Eu era super hater de gamer. Inclusive namorei com uma pessoa maravilhosa, mas não demos certo porque ele era gamer. É engraçado porque hoje olho para trás e penso que 'se eu tivesse conhecido ele eu teria sido uma namorada perfeita’ mas eu era muito imatura sobre isso".

"Tive uma criação muito restrita e mal me divertia, na minha adolescência a minha vida era estudar muito para passar na USP [Universidade de São Paulo]. Demorou um pouco para entender que eu estava trabalhando em um cenário de jogos e que isso estava dando dinheiro na minha vida. Me formei agora em Biomedicina, mas minha renda vem totalmente da internet, de trabalhar com games. Foi muito difícil passar na faculdade, no dia da minha formatura inclusive eu falei que a universidade seria a solução da minha vida, achava que depois da faculdade eu seria feliz, mas não foi isso que aconteceu" contou ela.

Foto: Ga Kim/Twitter - League of Legends
Foto: Ga Kim/Twitter

Assim, a trajetória de Ga até os esports começou em 2018 após sua família passar por problemas financeiros e Ga se ver precisando de renda própria, foi quando passou a procurar por oportunidades de dar aulas de coreano colocando cartazes na rua: “Era a coisa que eu sabia fazer e poderia começar na hora, só que ninguém queria ter aula comigo, ninguém falava comigo e ninguém me contratava. Comecei a colocar na internet, e logo de cara a Red Canids já ligou para mim. Eles queriam que eu fosse dar aulas de inglês ou de coreano para os coreanos que estavam no time, inclusive achei que era uma grande balela, pois eu nem sabia que existia esse mundo de games. Então nesse dia que fui fazer o teste levei meu irmão mais novo, inclusive meu irmão mais novo "hitou" e é muito famoso no TikTok (kimmateus99). Naquela época a nem imaginávamos que dava para fazer dinheiro desse jeito, achávamos que era algo muito fora da realidade”.

Fui na Red e era real. Era uma casa com computadores, com pessoas discutindo como jogar melhor. E uma das coisas mais loucas para mim do cenário é que se tem algo para fazer e tem alguém jogando, as pessoas respeitam a pessoa terminar a partida. Eles me queriam como professora, mas estava muito em cima, a Red teve que lidar com muita coisa e eles gostaram muito de mim como tradutora. Eu traduzia as coisas na hora dos feedbacks. Acabaram me contratando e entrei definitivamente como tradutora na Red.

Experiências no CBLOL

Ga, que quando começou atuava como tradutora de times como a Red Canids e depois o Flamengo, passou a atuar na Riot Games em 2020. Foi um ano no qual diversos jogadores coreanos vieram para para o Brasil em times que disputaram o CBLOL, assim, ela foi contratada como freelancer e acabou se mantendo: "Eles queriam que eu ficasse só com eles, falaram que se eu estivesse em um time, os jogadores poderiam não se sentir à vontade de responder questões sobre draft, por exemplo".

Perguntamos como foi se adaptar ao ritmo do CBLOL, considerando sua atuação única com times anteriormente, a tradutora contou sobre uma questão muito relevante: o apego e os laços criados com os jogadores: "Um dos motivos pelos quais parei de trabalhar com times aqui no Brasil era que, até eu ver o Shrimp ganhar eu tive que o ver perder, tive que ver o Sky perder. Tive que ver vários meninos que eu tinha carinho, perder. Teve uma hora que pensei que não aguentaria mais isso, porque dói muito".

"Nessa final do CBLOL, eu achei que ficaria bem melhor porque eu não estava trabalhando para um time, eu estava trabalhando para a Riot. Achava que não estava apegada a nenhum dos meninos e não sofreria vendo nenhum deles perder, só que sofri da mesma forma. Fico pensando que não existe uma final sem sofrimento."

Ga Kim com Croc e Yuri, que estavam na final Rensga x Red Canids

Perguntamos sobre quais foram suas melhores experiências durante esses anos com esports, e ela destrinchou um pouco sobre um sentimento que Jéssica Liar e as gêmeas da paiN também sentiram ao entrar no cenário: a constante percepção de estar em um sonho. "Sabe quando uma coisa muito boa acontece com você e então você fica muito feliz e tem aquele pico de adrenalina? Eu sentia que estava nesse pico a todo momento. E todo estímulo repetitivo enjoa, tudo que você vê toda hora você fica acostumado com aquilo. Só que foi muito mágico esses primeiros anos", contou ela para nós.

Infelizmente, nem tudo são flores nos esports: "Já teve situação que um coach chegou para mim falando ‘League of Legends é um jogo de homem, o que que você está fazendo aqui? Você é uma mulher, não deveria estar aqui.’ Na época não me ofendi com isso porque eu estava precisando tanto de dinheiro que eu pensava que era só conseguir me acostumar. Só depois que meu irmão me alertou que esse cara estava tentando fazer eu me sentir incapaz por ser mulher. É muito zoado porque esse cara foi demitido e resolveu me mandar mensagem falando que se eu fosse um pouco mais velha ele me chamaria para morar com ele. Eu fiquei tipo ‘você não me odiava, cara?’".

Em contra partida, Ga também não deixou de falar qual foi sua melhor experiência: "Com certeza foi ver o Shrimp chorando durante a final de 2019, no Rio de Janeiro, com o Flamengo".

Shrimp e Ga durante o segundo split do CBLOL de 2019 — Foto: Ga Kim/Instagram - League of Legends
Shrimp e Ga durante o segundo split do CBLOL de 2019 — Foto: Ga Kim/Instagram
Shrimp e Ga durante o segundo split do CBLOL de 2019 — Foto: Ga Kim/Instagram - League of Legends
Shrimp e Ga durante o segundo split do CBLOL de 2019 — Foto: Ga Kim/Instagram
Acabo criando vínculos com todos os meninos, inclusive nessa segunda vez que o Croc e o Yuri estavam indo para a Coreia, eles me pediram para ver eles porque eles iriam fazer uma conexão aqui em São Paulo que duraria duas ou três horas, porque talvez seria a última vez que eu os veria. Acabo criando amizade com todos eles, só que quando não trabalhamos mais juntos sempre damos uma afastada. Faz um bom tempo que não falo com o Shrimp, sabe.

Não apenas em uma liga: LLA x CBLOL

Ga Kim não se limitou a permanecer apenas no CBLOL, ultrapassou as barreiras nacionais e ingressou na Liga Latinoamérica, a LLA, atuando também como tradutora pelo time Isurus. Buscou oportunidades por lá e contou que, como já tinha um portfólio no Brasil, sabia que conseguiria, uma hora ou outra.

Sendo duas realidades diferentes, o perguntei quais foram as diferenças mais sentidas pela sul-coreana entre as duas regiões. A primeira é suporte mental recebido pelos jogadores da LLA, que possuem mental coach, além de psicólogos. "Outra coisa que notei de bastante diferença é que os meninos jogam com a galera da região do NA, então eles estão super afinados. Senti um pouco de diferença no nível."

"No Brasil também há uma vibe de curtição, algo que não acontece na LLA. Aqui no Brasil todos os times são brasileiros, então há um clima amigável, tem um clima menos pesado que na LLA que é mais competitiva. Lá como os times são de países diferentes, há uma diferença."

Ficamos curiosos quanto à sua rotina e como ela faz para conciliar diferentes funções, e Ga revelou que o mais complicado é durante o início do split: "No começo os jogadores estão muito perdidos, então tenho que ficar muito mais em cima deles. Na Riot é sempre bem tranquilo, até tem épocas mais corridas, mas o que mais pegou para conciliar foi de fato no começo do split, porque foi a Riot, o time e também a escola de coreano que eu tenho, a Manse!. Fazer as três coisas no último split foi bem puxado, e eu ainda estava me formando, foi bem louco".

Passando o começo do split ficou bem mais tranquilo, no início é o momento em que os jogadores estão se adaptando e aprendendo a jogar juntos. Esta é a parte mais complicada, porque é preciso os ensinar a usar o vocabulário, porque alguns jogadores sabem inglês mas outros não, então você precisa os ensinar a ter aquela comunicação rápida: o que ele precisa falar dentro do jogo em determinado momento, e quanto mais curto e rápido melhor. Então foi ensinando isso, e o começo do split é o momento que mais tem conflitos, eles brigam em um bom sentido ,pois essa discussão é necessária. Só por um grande milagre que os times se encaixam e se acertam desde o começo, mas não é o que acontece. Quando o time não briga, eles não acertam esses problemas, e aí no stage e a longo prazo fica um horror. Foi um período que eu dormi menos também, por estar muito animada fazendo algo e nem percebendo que o tempo passa.

Influenciadora do Flamengo e repórter de Wild Rift

Ga cria conteúdo e tem perfis no Instagram, Twitter e TikTok recheados de vídeos com trocadilhos em coreano, dicas para aprender o idioma e suas vivências nos esports - colecionando seguidores. Perguntamos se, quando passou a trabalhar no cenário, se imaginava como influenciadora anos depois: "Não imaginava que me tornaria criadora de conteúdo. Quando entrei no meio, reparei que todo mundo tinha bastante seguidores. Eu achava - na minha inocência - que quando alguma pessoa famosa me divulgasse eu iria conseguir bastante seguidores e ficaria conhecida. Eu trabalhava com os jogadores e pedia para eles me divulgarem como tradutora e eles respondiam um simples: ‘não’. Depois de um tempo eu fui divulgada por algumas pessoas e isso não me deu bastante seguidores como eu pensava".

Completando que até hoje tem dificuldades para se considerar influenciadora, pois não investe muito nisso, Ga relevou sua vivência no Flamengo: "Nas minhas primeiras experiências houve altos e baixos. Então entrei no Flamengo, não consigo falar nada de ruim daquela primeira gestão, eles me deram muita liberdade lá dentro. E eu tinha muita cara-de-pau na época, não tinha medo de ficar postando vídeo toda hora, então postava por diversão mesmo, e de alguma forma a galera do Flamengo acabou me conhecendo por conta disso."

Uma coisa é certa: Ga simplesmente não consegue ficar parada e busca constantemente por novas ocupações. Sempre teve o desejo de ser tradutora de entrevista, atuar como repórter, mas não atrás das câmeras: "Sempre quis estar ao vivo, mas no LoL não existe essa abertura. Parece que a galera não quer ouvir os coreanos. Falo quatro línguas hoje, comecei a pegar o espanhol na LLA, mas mesmo assim o sentimento é de que isso nunca fosse acontecer."

Quando eu entrei no cenário soube desde o primeiro dia que queria ser apresentadora, que queria ser repórter. Só que percebi que eu nunca conseguiria. Mas não estou parando; estou tentando, estou correndo para outros lados.

Assim, viu uma oportunidade no Wild Rift, jogo mobile da Riot Games: "Um dos motivos que estou indo para o Wild Rift é que acredito demais que o Brasil tem o poder de representar a gente lá fora, acho mesmo que vamos ser uma das melhores regiões fora do Brasil. Somos muito fortes em jogos de celular, espero que tenhamos um bom resultado, mas independente disso; é algo que eu preciso fazer, eu preciso dessa experiência".

Neste gancho, contou seus planos para o futuro:

"Desde que eu percebi que nada do que eu quero acontece na hora que eu quero, eu percebi que é necessário preparar muita coisa e esperar dar certo. Estou fazendo um milhão de coisa ao mesmo tempo, eu quero voltar a fazer entrevista de Wild Rift. Algo que me pega um pouco é a sensação de que não tem mais mercado para mim, a sensação de que as pessoas que vão estar no cenário de Wild Rift já foram selecionadas e que não há espaço pra mim. Isso é um pouco desmotivador e é um dos motivos de eu ter parado. Só que eu resolvi que eu quero continuar".

Também podemos esperar uma tradução ao vivo feita por Ga. Independente de dar certo, ou não, ela garantiu que continuará correndo atrás disso.

Saindo da área dos jogos, contou sobre seus interesses em sua formação, a Biomedicina, e dissertou sobre não querer trabalhar para outra pessoa, mas talvez abrir uma empresa na área: "Gosto muito de estudar questões de anti envelhecimento, eu não consigo aceitar o fato de que todos nós vamos morrer. Encaro a morte como uma doença, para falar a verdade. Então eu quero continuar estudando mais sobre como prolongar mais a vida das pessoas de uma forma saudável e sustentável. E se possível eu gostaria de nunca morrer".

Um espaço para falar sobre o cenário

Demos a fala para Ga destrinchar sobre o cenário, e ela tocou em um ponto que é continuamente debatido entre aqueles que trabalham e querem trabalhar com esports:

As pessoas não conseguem entender direito que é real: que trabalhar com jogos é real. Muitas pessoas vêem nos jogadores ídolos, então acreditam que é um sonho onde tudo é maravilhoso. Mas como profissional, uma hora é necessário virar para um jogador que tem uma conduta ruim e ser reto e direto com ele. O que eu mais vejo acontecer no cenário é uma pessoa que era muito fã de um time ou um ídolo se tornando manager, e ter que lidar com uma parte ruim do ídolo dele. Muitos não sabem lidar com isso, e o que eu quero dizer é que as pessoas não são ruins, mas trabalhar com esports não é uma brincadeira, é uma coisa séria.

A conclusão de tudo isso é que basicamente trabalhar com esports é uma questão de amadurecimento, apesar de tudo que as pessoas veem ser bonito, o que acontece por trás das câmeras é muito duro.

Para acompanhar Ga Kim

  • Twitter: @gakim0
  • Instagram: @gakim0
  • YouTube: Ga
  • TikTok: @ga1kim

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Lorena de Araújo  - Redatora

Você pode me encontrar por aí escrevendo sobre LoL e tentando arrumar um jeito de incluir cultura pop. Tenho imensuráveis horas em Stardew Valley e vontade de ser uma protagonista do Studio Ghibli.

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