O Campeonato Brasileiro de League of Legends (CBLoL) 2020 estreou neste sábado (25) sem nenhuma mulher na equipe de casters. Sim, Letícia Motta e Ravena “LunarFox” Dutra foram confirmadas como participantes do programa Depois do Nexus, porém, nenhuma das duas participará do campeonato como narradora ou comentarista.
O torneio acontece desde 2012 e, mesmo assim, a única mulher a compor o elenco de talentos foi Carol “Tawna” Oliveira, que assumiu o papel de repórter entre 2017 e 2019. Com sua saída, ela foi substituída por Rafaela Tomasi, que em 2020 permanece como a única mulher participante da equipe de transmissão, realizando entrevistas.
A nova temporada também conta com a primeira pro player a disputar o campeonato: Júlia "Mayumi" Nakamura, inscrita pela INTZ para o 1º split de 2020. Fora Mayumi, outras mulheres passaram pelas equipes participantes da competição: psicólogas, como Alessandra Dutra (da RED Canids) e Natália Zakalski (INTZ); Marina Leite, dona da PRG Esports, e outras colaboradoras essenciais para o trabalho das line-ups. Porém, elas sempre foram a esmagadora minoria em um ambiente predominantemente masculino.
Sete anos de campeonato e apenas um número seleto de mulheres passou pelo palco do CBLoL. Além disso, demorou todo este tempo para que a desenvolvedora contratasse mulheres para participar de um de seus programas. Por que isso acontece?
Existem casters de LoL?
Desde 2012 o CBLoL recebeu poucas alterações em seu elenco de talentos, composto pela mesma formação por anos: Guilherme "Tixinha" Cheida, Tácio "Schaeppi" Schaeppi, Gustavo "Docil" Docil, Gustavo "gstv" Cima, Diego "Toboco" Pereira, Alexandre "Skeat" Trevisan (que assumiu o lugar de Flávio "P3po" da Silva em 2016) e Gustavo "Melao" Ruzza.
Agora, o CBLoL não terá mais apresentação e contará com Diniz "Gruntar" Albieri e Schaeppi como narradores; Skeat e Tixinha como comentaristas; Melao, gstv, Murilo “Takeshi” Alves e Carlos “Nappon” Rücker como analistas. Já o Circuitão terá Arthur "Vecet" Nogueira como narrador e Dudu "etsblade" Souza e Gabriel "MiT" Souza como analistas.
Para muitos que acompanham somente o CBLoL ou pouco além dele, a impressão que fica é: se mal existem pro players mulheres, então não deve haver nenhuma narradora, comentarista ou analista trabalhando com League of Legends. Ainda existe um grande equívoco entre a comunidade ao pressupor que mulheres não jogam ou não se interessam pelo competitivo - e não é à toa: faltam exemplos para seguir, figuras para inspiração. Este é o maior erro da Riot Games Brasil até o momento, porque existem, sim, mulheres que trabalham como casters no cenário brasileiro de esports.
Em 2018, espectadores da Superliga ABCDE puderam assistir ao trabalho e estreia de Bianca "Thaiga" Lula como analista do campeonato - atualmente ela é streamer da paiN Gaming e faz parte do Garotas Mágicas, grupo de streaming composto também por Briny de Laet, Gabriella “Gabruxona” Antunes, Mônica "Riyuuka" Arruda e Manuela “Kyuure”. Em 2019, Thaiga retornou ao torneio, mas como apresentadora. Ela também trabalhou como analista do Circuito Desafiante - competição que também contou, por anos, com Camila “Camilota” Silveira como apresentadora.
Em 2019, o cargo de analista da Superliga ficou nas mãos de Letícia Motta. A profissional já fez cobertura jornalística sobre o CBLoL, escreve colunas de análise para sites como o Mais Esports, participa do programa Around the Rift ao lado de Dudu, Skeat, Bernardo “Berunardo” Pereira e Diego “Lunacy” Oliveira e foi caster de torneios como Logitech G Challenge, Girl Gamer Festival e Brazilian Esports League.
Além disso, há também o exemplo de Ravena “LunarFox” Dutra, que atuou como apresentadora e comentarista de diversos torneios - desde o Circuito Desafiante em 2016 até o Projeto Sakura, Projeto Invocadoras, White Rabbit Cup, Girl Gamer Festival 2019 e Liga Escolar de LoL 2019.
Neste primeiro semestre de 2020, Letícia e Ravena farão parte do programa Depois do Nexus, exibido às segundas-feiras, às 20h. Entretanto, com tantos campeonatos contando com mulheres em suas equipes de casting, inclusive os que pertencem à Riot, como a LCS, LEC e LPL, é de se perguntar porque as duas profissionais não receberam lugares na transmissão oficial do CBLoL. Pensando na experiência profissional que ambas acumulam, a participação da analista e da comentarista no programa parece uma mera migalha frente a seus verdadeiros potenciais.
Ainda que elas não tenham a mesma experiência atual que o time de casting do CBLoL têm, no início do cenário competitivo brasileiro de LoL casters como Tixinha e gstv também começaram do zero, participando de pequenos e grandes torneios, até serem contratados pela Riot Games e se desenvolverem como os profissionais reconhecidos que são hoje.
Durante a coletiva de imprensa sobre o 1º split do CBLoL 2020, realizada na terça-feira (21), perguntamos ao diretor de esports da Riot Games Brasil, Carlos Antunes, o motivo pelo qual Letícia e Ravena não foram adicionadas à equipe de casting do CBLoL. “A nossa ideia é inovar não só na transmissão, mas em todos os conteúdos e conversas que a gente gera. Para nós, especificamente no caso do Depois do Nexus, trabalhar nele era uma prioridade para que a gente gerasse um outro tipo de conversa que pudesse passar pelos assuntos que a gente já cobria, mas que reverberasse de uma maneira diferente. Então, trazer a perspectiva das duas e também do Gustavo "Baiano" Gomes e do Matheus "Mylon" Borges eram pontos interessantes para nós, porque são pontos de vista que a gente já acompanha e respeita o conhecimento e a repercussão”.
Quando questionado se existe a possibilidade das participantes do Depois do Nexus serem contratadas para fazer parte do CBLoL em um futuro próximo, Carlos respondeu positivamente. “Sim, sempre existe a oportunidade. Não é sobre uma medida maior ou menor, a gente queria mexer em várias frentes. Achamos adequado começar testando muitas coisas no Depois do Nexus e temos plena confiança de que vai ser incrível, tanto que faremos muitas mudanças ao mesmo tempo. E no caso das transmissões, nosso foco era contar com pessoas que já fizeram parte do CBLoL nos ajudando a fazer o tricaster, então acho que são mudanças específicas que vão acabar requerendo mexidas e talentos específicos. Mas o mais importante é, quando a gente começa a trabalhar o céu é o limite. Quanto mais aquele ponto de vista, estilo ou formato começa a crescer, mais a gente vai querer que aquilo seja a nova cara, o novo jeito, o Gruntar é uma prova disso”.
Vale lembrar que existem narradoras, comentaristas e analistas trabalhando com outros jogos: Bárbara “Babi” Micheletto, Fernanda "Nanda" Piva e Renata "reehplays" Bagnato como casters de CS:GO; Nayara "Naysyl" Sylvestre, caster e pro player de Hearthstone; Camilla "Milla" Garcia, narradora de Rainbow Six Siege e vencedora do reality show Looking for a Caster; Victória “Viic” Rodrigues, comentarista de Rainbow Six Siege; Ana Paula "Ana Xisdê" Cardoso, caster que já trabalhou com League of Legends, Overwatch e Free Fire, possui experiência internacional e venceu o prêmio de Melhor Caster do Prêmio Esports Brasil 2019… E estes são apenas alguns exemplos em um mar de outros jogos e outras profissionais.
Contratar um especialista em outro jogo é uma decisão que a Riot já tomou no passado. Antes de se tornar comentarista de League of Legends, Skeat trabalhava como caster e produtor de conteúdo de Dota 2.
Ter poucas mulheres na equipe de casting não é uma exclusividade do CBLoL. As ligas oficiais de League of Legends em outras regiões que contam com mulheres na transmissão ainda têm mais homens. Além disso, na maior parte dessas competições, infelizmente as mulheres não ocupam a bancada como analistas, comentaristas, narradoras ou outras funções técnicas.
Na LPL, é possível citar a apresentadora e repórter Duan "Candice" Yu-Shuang e as comentaristas Kris, Hitomi e Rita. Na LEC, temos Eefje "Sjokz" Depoortere como apresentadora, Laure "Bulii" Valée como entrevistadora e Indiana "Froskurinn" Black como comentarista. Ovilee “Ovilee” May é entrevistadora na LCS, Sookie na liga LLA e Minh Nghi na VCS.
É verdade que algumas das ligas da Riot sequer tiveram a presença de mulheres em qualquer posição oficial na transmissão - algo que o CBLoL já alcançou com Tawna -, mas é importante lembrar que a equipe de broadcast não pode simplesmente parar neste ponto. Tudo precisa evoluir.
Existem muitas casters, apresentadoras e jornalistas no cenário brasileiro de League of Legends e o CBLoL tem plena condição de treiná-las e prepará-las para as transmissões de todos os finais de semana.
Ninguém está pedindo para que mulheres com diferentes funções sejam contratadas e jogadas na transmissão do CBLoL como uma resposta automática a este texto. O que queremos é oportunidade para as profissionais já capacitadas e com conhecimento para participar do casting do CBLoL e, se necessário, treinadas para desempenhar suas funções.
Por isto, a ausência de mulheres no corpo de talentos e de jogadores do CBLoL e do Circuito Desafiante é uma oportunidade perdida de renovar e melhorar o cenário. Por mais um ano, vemos o ciclo sendo perpetuado. Quando vamos finalmente quebrar isso?
Melany Lee é streamer de Fortnite, Carol Costa é apresentadora e jornalista no IGN Brasil, Eliana Dib é produtora de jogos, Danielle "Cherna" Andrade é pro player de Rainbow Six Siege, Victoria Moreira é editora de vídeos sobre games e Marina Leite é sócia da organização PRG Esports. Há uma coisa em comum na história destas seis mulheres: o amor pelos videogames. Saiba tudo sobre essas profissionais no vídeo acima.