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Ex-jogador do Esquadrão Golden, do Bahia, relata condições precárias em casa da organização

Ex-jogador do Esquadrão Golden, do Bahia, relata condições precárias em casa da organização
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Em comunicado, equipe diz não ter vínculo com o imóvel e nem relação com o acontecido, embora as partes tenham exercido funções dentro do projeto

Ex-jogador do Esquadrão Golden, do Bahia, relata condições precárias em casa da organização

O cenário competitivo de Wild Rift está apenas em seus primórdios, com iniciativas envolvendo grandes equipes já consolidadas do cenário de esportes eletrônicos, bem como projetos inéditos e mais recentes. O mesmo se aplica aos jogadores que almejam crescer dentro deste novo ecossistema, mas que acabam enfrentando obstáculos pelo caminho.

Esta é a situação de Carlos Douglas de Almeida, o Orochi, que relata ter vivido “os piores meses da sua vida” enquanto esteve com o Esquadrão Golden, organização que leva a marca do Bahia nos esportes eletrônicos. O atleta morou em uma casa da equipe, dividindo-a com o treinador do time, e segundo ele lhe faltaram necessidades básicas como chuveiro elétrico, descarga e até mesmo alimentação para refeições diárias. Além disso, o jogador diz ter se incomodado com a manutenção da residência durante toda a sua estadia.

A chegada do Bahia nos esportes eletrônicos veio por meio de uma fusão do time com a organização baiana Golden Vulpes, que já atuava neste cenário há alguns anos. A parceria foi firmada em abril de 2021 e abrange diversas modalidades, como Free Fire, Wild Rift, League of Legends, CS:GO e Valorant. Este modelo de times de futebol em parceria com outras empresas já é bem conhecido dentro do meio, com exemplos de Flamengo, Botafogo, Santos entre outros que utilizaram desta forma para ingressar neste cenário que cresce gradativamente todos os anos. Com a parceria, a Golden Vupes passou a ser Esquadrão Golden e a levar o escudo do clube como marca.

Orochi, natural do estado de Espírito Santo, entrou justamente em abril para o Esquadrão Golden e como relata, foi ele próprio o responsável por unir o elenco da organização para a disputa dos campeonatos de Wild Rift, que neste ponto participava de eventos de maneira completamente remota. Conforme documento obtido pela reportagem, o primeiro contrato de prestação de serviços oferecido pela equipe foi com contraprestação de R$ 250 por mês, com possibilidade de aumento do vínculo e também do valor com base no desempenho. Com boas atuações, Orochi despertou olhares de outros times do cenário, chegando a receber uma proposta que lhe interessou, oferecendo também a possibilidade de mudança para uma gaming house. “Eu estava com problemas aqui dentro de casa, isso acabava afetando muito o meu mental”, conta o jogador. O atleta diz não ter tido sucesso no pedido de rescisão do contrato com o Esquadrão Golden por conta da multa rescisória de R$ 25 mil.

Os problemas familiares aumentaram e em um esforço para também compensar a oferta de outras organizações, o Esquadrão Golden ofereceu a Orochi a oportunidade de se mudar para Salvador, onde ficaria hospedado em uma gaming house inativa da organização, com despesas pagas pela staff, desde a viagem até as necessidades básicas do atleta, segundo ele. “Eu contei dos meus problemas e eles compraram uma passagem para mim quase no mesmo dia. Não tive nem tempo de pensar ou explicar para a minha avó, e ela chorou muito querendo que eu não saísse de casa”, relata Orochi.

“Quando eu cheguei lá, a casa era imunda. Mas eu não me importei tanto no começo, pois estava animado com essa nova etapa da minha carreira e achei que era algo apenas repentino”, conta Orochi sobre suas primeiras impressões ao chegar à casa do Esquadrão Golden. Segundo o jogador, a primeira semana por lá foi tranquila, com café da manhã e refeições para que ele pudesse se alimentar diariamente. A partir da segunda semana é que começaram os primeiros problemas, conforme ele relatou.

Ainda conforme declaração do atleta, a staff não comprava mais mantimentos para a casa e a alimentação oferecida era composta por arroz e frango ou arroz e ovo, todos os dias da semana. Passado mais um tempo, nada mudou. O chuveiro não havia sido consertado, não havia nenhum suporte para a limpeza da residência na casa e a descarga continuava com problemas.

O jogador também relatou que ao fim do seu primeiro contrato chegou a fazer testes em outras equipes, por não aguentar mais viver naquelas condições. De acordo com o jogador, ele conversou com Kaio Araújo, dono do Esquadrão Golden, para expor sua insatisfação com a situação, dizendo que precisava de ao menos um chuveiro elétrico para conseguir relaxar. Na conversa, o CEO diz se prontificar a resolver o problema, mas segundo o atleta, ele nunca foi solucionado.

Orochi ainda conta que, por não ter o vínculo de renovação assinado e por ser o único atleta do time dentro da casa, a staff do Esquadrão Golden passou a pressioná-lo para que ele não saísse da organização de maneira tão prematura. O jogador ainda sugeriu que renovaria o contrato caso pudesse retornar para sua casa no Espírito Santo, mas novas promessas de melhoria nas condições o convenceram a permanecer por mais tempo.

Como relata o atleta, a situação ao invés de melhorar, se tornou pior. Com contrato renovado em junho e agora recebendo R$ 900 por mês de contraprestação, Orochi diz que direcionava todo o dinheiro para ter mais opções de alimentação. O jogador conta que a organização comprou uma caixa de macarrão instantâneo, que foi seu principal alimento em todas as refeições, até mesmo no café da manhã, por duas semanas. Após reclamações e com o jogador em estado de esgotamento, o Esquadrão Golden aceitou rescindir o contrato e arcar com os custos da viagem do atleta de volta para o Espírito Santo.

Orochi conta que no final do mês de julho, seus últimos dias dentro da casa foram custeados com ajuda do streamer Katrina, que lhe enviou dinheiro para que pudesse se alimentar até a data do voo de volta ao Espírito Santo. O atleta retornou para a sua cidade natal em 5 de julho, três meses depois da viagem para a gaming house.

O que diz o Esquadrão Golden

A reportagem procurou o Esquadrão Golden, que em contato afirmou que esteve a par de parte das situações de vivência de Orochi na casa. “Estávamos cientes apenas do chuveiro elétrico, apesar do mesmo só ter se queixado sobre isso um mês e meio após sua chegada”.

Quanto à manutenção do ambiente, a organização alega primeiro que o imóvel não tem relação direta com o Esquadrão Golden após seu funcionamento como gaming house ter sido encerrado em março de 2021, passando a ser uma residência comum do diretor, que convidou o atleta a morar no espaço em decorrência dos problemas familiares relatados por ele. Ainda segundo posicionamento da equipe, foi acordado que o atleta seria responsável por seus cuidados básicos, como “a limpeza de seu próprio quarto, sua própria louça e coisas de convívio”.

Quando questionada sobre a alimentação, a organização diz que houve uma ocasião na qual o diretor do Esquadrão Golden estava viajando a trabalho e foi acionado sobre a falta de mantimentos na residência, mas que ele enviou dinheiro para a compra de alimentos para suprir a necessidade do dia, bem como compras no dia seguinte.

Por fim, o Esquadrão Golden declarou “não ter envolvimento com o ímovel citado, além de relação alguma com o acontecido, embora as partes tenham exercido funções dentro do projeto”, conforme posicionamento fornecido ao MGG Brasil por e-mail.

A reportagem também procurou o Esporte Clube Bahia, que afirmou não participar ativamente da gestão das iniciativas de esports que levam a marca da equipe, além de reiterar as declarações dadas pelo Esquadrão Golden.

O que dizem os especialistas

Para Nicholas Bocchi, advogado especialista em esporte eletrônico, há de início uma irregularidade de um clube realizar qualquer contrato com atleta que não seja de trabalho ou de formação, uma vez que a relação entre jogador de modalidade coletiva e clube, por natureza, sempre será empregatícia, de maneira que a legislação trabalhista deverá ser aplicada, considerando a primazia da realidade sobre a forma, ou seja, "que importa mais aquilo que acontece na prática do que aquilo que está escrito no contrato".

Ainda segundo ele, “se o atleta provar que a habitação na qual ele residia foi fornecida pelo clube, ainda que indiretamente através de algum sócio, por conta de seu cargo na empresa, deverá ser considerado salário in natura e as condições desse ambiente, que também era ambiente de trabalho, será de responsabilidade do clube”.

Salário in natura, também conhecido como salário utilidade, é toda parcela ou bem fornecido pelo empregador como gratificação por trabalho desenvolvido, prevista pelo artigo 458 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), incluindo alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações. Como ressalta o advogado, o mesmo artigo “ainda deixa claro que será levada em consideração a habitação fornecida não apenas por força de contrato, mas também por conta do costume”, ou seja, mesmo que o acordo de habitação tenha sido feito informalmente, fora de um contrato.

Como explica Bocchi, seria necessário definir o porquê de a habitação ter sido oferecida, se pelo trabalho ou para o trabalho. “A habitação oferecida para o trabalho é aquela que é fornecida para o empregado para que ele preste o serviço e será considerada instrumento de trabalho. Se sem a moradia o atleta não conseguisse exercer a sua função, ou a moradia ajudou o atleta a executá-la, então a habitação oferecida por um clube foi para o trabalho”, detalha o advogado.

“Já a habitação oferecida pelo trabalho é aquela oferecida como um benefício ou um pagamento pelo trabalho do empregado”, continua Bocchi. “Se a habitação oferecida ao atleta não tiver vínculo com o interesse do clube em melhorar seu desempenho em treinos e competições, mas sim porque ele é valorizado pelo clube, então a habitação oferecida foi pelo trabalho”.

Na avaliação de Bocchi, “se a habitação foi oferecida porque o atleta seria expulso de casa e não teria como exercer seu trabalho, então se trataria de habitação para o trabalho, situação na qual não haveria impactos salariais para o atleta”.

Por fim, segundo o advogado, “o dever de manter a qualidade da moradia que também se confunde com local de trabalho não decorre do fato de a empregadora oferecer a habitação, na verdade essa obrigação existiria mesmo se o atleta estivesse em sua própria casa. Mesmo em situação de trabalho a distância, a empregadora deve oferecer um ambiente de trabalho que siga as normas mínimas de segurança, higiene e ergonomia".

“O home-office está em voga por conta da pandemia do coronavírus, e durante esse período muitas empresas foram acionadas na justiça do trabalho por não fornecerem condições mínimas de trabalho ao trabalhador à distância, inclusive mobiliário”, conta o advogado. Essa obrigação decorre do Artigo 75-D da CLT: “As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito”, finaliza Bocchi.

Orochi tem intenção de buscar seus direitos judiciais por conta da situação que passou nos três meses que esteve na residência.

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Luis Santana
Showtana  - Redator

Estudante de jornalismo com paixão em contar histórias. Amante do cenário competitivo de League of Legends e assíduo comentarista de coisas que não sou pago para fazer.

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